Para o Fórum 21
A quinta plenária do Conselho de Desenvolvimento Econômico Social Sustentável (Conselhão), ocorrida na última terça-feira (05/08) em Brasília, foi marcada pela defesa da soberania nacional ante a entrada em vigor, no dia 6 de agosto, das tarifas de 50% dos Estados Unidos sobre 3.800 produtos brasileiros.
Durante a plenária, o presidente Lula recebeu propostas consensuadas pelos grupos de trabalho do Conselhão. “São 55 frentes de trabalho que os conselheiros e conselheiras tocam junto com os ministros e ministras, construindo propostas concretas para os desafios do Brasil. Caminhos que precisamos percorrer”, destacou Olavo Noleto, secretário executivo do Conselho.
Também foram empossados 155 novos membros do colegiado e, reconduzidos ao cargo 131 pessoas. “Aqui, temos o com terra e o sem terra, os bancos e os trabalhadores, a indústria e o ambientalista. Essa diferença é a nossa maior riqueza”, avaliou Noleto.
Ao longo da cerimônia, o presidente Lula assinou decretos e acordos de cooperação das propostas geradas pelos grupos de trabalho do Conselhão e acompanhou a posse das lideranças que irão, a partir de agora, aconselhá-lo em questões de interesse nacional.
Em meio aos ataques de Trump, a defesa da soberania e da democracia permeou as falas do alto escalão da República presentes na plenária, como o presidente e a primeira-dama, Janja, o vice Geraldo Alckmin, os ministros Fernando Haddad (Finanças) e Gleisi Hofmann (Relações Institucionais) e o chanceler Mauro Vieira (Relações Exteriores), além de outros ministros, ministras e autoridades presentes.
Em defesa da soberania
A taxação de Trump também foi mencionada pelos participantes do grupo de trabalho sobre o tema. Ao representar a classe artística, a atriz Dira Paes destacou o papel da cultura nas lutas sociais do país. “Somos um país livre, soberano e democrático”, destacou.
Paes elogiou a composição plural do Conselhão: “aqui as diferenças, seja de pensamento, seja de qualquer origem, não são um problema. São justamente o contrário, são a nossa pluralidade, a nossa força.” E salientou que a pluralidade é essencial para a elaboração de políticas públicas que respondam aos desafios do país.
A nova conselheira destacou os mais de 200 anos de relações diplomáticas entre Brasil e EUA e defendeu o respeito mútuo entre as nações. “Reafirmamos a defesa da nossa soberania e das nossas instituições democráticas, incluindo o Poder Judiciário e o Supremo Tribunal Federal” e a “total disposição para contribuir com as negociações comerciais respeitosas entre nossos países”, apontou.
“O Brasil é um país soberano que defende a paz, não só do nosso país, mas a paz mundial. Um país que respeita à autodeterminação dos povos. Mas, sobretudo, um país que também quer ser respeitado”, frisou.
Na sequência, a conselheira Priscila Nasrallah, diretora da Associação Brasileira dos Produtores Exportadores de Frutas e Derivados (Abrafrutas) e produtora de uva e manga no Vale do Rio São Francisco, reforçou a importância estratégica da fruticultura para a economia nacional e pediu atenção especial ao setor duramente atingido pelas sanções comerciais.
“A fruticultura brasileira gera renda, trabalho e dignidade para milhares de famílias. Impacta diretamente a economia de todas as regiões do país”, destacou. Ela contou que o segundo semestre do ano representa o maior volume de exportações e que os Estados Unidos são um “destino chave para frutas como manga, uva, melão, melancia, mamão, papaia e frutas processadas”.
Em 2024, relatou, o país exportou 77 mil toneladas de frutas para o mercado norte-americano. Ao governo, ela solicitou a postergação da entrada em vigor das tarifas, o que permitiria ao setor se adaptar e preservar parte de sua produção e dos seus contratos internacionais. Também enfatizou a necessidade de ampliação dos mercados para a fruticultura brasileira e destacou a situação de vulnerabilidade dos pequenos produtores que precisam de proteção e respaldo financeiro do governo federal.
‘Diplomacia não significa submissão’
O conselheiro Clemente Ganz Lúcio, ex-diretor técnico do DIEESE e atual presidente do Fórum das Centrais Sindicais, defendeu a atuação coordenada do governo, dos trabalhadores e da sociedade civil para enfrentar a guerra tarifária de Trump.
A resposta brasileira, segundo Ganz, deve ser estratégica, duradoura e articulada com a mobilização social, a diplomacia e o fortalecimento da produção nacional. Ele avaliou como corretas as medidas adotadas pelo governo brasileiro e mencionou as propostas de curto e longo prazo já entregues pelas centrais para enfrentar os impactos das tarifas.
Ele também afirmou que os sindicatos estão engajados em ações de mobilização nacional e internacional com centrais dos Estados Unidos, Canadá, União Europeia e México, além de ações previstas na Organização Mundial de Comércio (OMC). “Vamos às ruas para mostrar a visão da sociedade sobre essa crise e fortalecer o enfrentamento a esse ataque injustificado ao Brasil”, apontou.
O conselheiro Josué Gomes da Silva, presidente da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp) descreveu a medida norte-americana como uma “agressão injusta” e defendeu que o país reaja com altivez. “Diplomacia não significa submissão. Negociemos com prudência, com humildade, mas com firmeza”, afirmou. Segundo ele, princípios não devem ser abandonados quando se tornam inconvenientes.
“É nossa responsabilidade tornar a economia brasileira mais forte e independente. Essa tarefa exige união nacional e uma agenda estruturada”, declarou. Ele propôs melhoria do ambiente de negócios, harmonia entre políticas fiscal e monetária para reduzir o custo de capital e impulsionar investimentos produtivos, e foco prioritário na educação e inovação como base para o aumento da produtividade.
Defendeu também um sistema tributário mais justo, segurança jurídica com marcos regulatórios claros, e uma atuação firme contra atividades ilegais. “Queremos um Brasil atrativo a investimentos, inclusive das empresas norte-americanas, que sempre foram e continuarão sendo bem-vindas ao nosso país”, concluiu.
O governador do Piauí e coordenador do Consórcio Nordeste, Rafael Fonteles, enfatizou a necessidade de ações emergenciais para conter os impactos sobre os setores exportadores do Nordeste, que empregam milhares de trabalhadores e sustentam economias locais.
Ele destacou que a região engloba setores sensíveis na pauta exportadora, como frutas, pescados, açúcar, mel, sal e minérios, cujas cadeias produtivas sustentam pequenas empresas e milhares de famílias e que, “embora não representem os maiores volumes financeiros, têm um impacto social imenso”.
Fonteles pediu atenção especial do governo aos trabalhadores dessas cadeias produtivas, que podem ser os primeiros a sofrer os efeitos do tarifaço com demissões, perdas de renda e fechamento de pequenos negócios. Ele lembrou a flexibilização das regras fiscais durante a pandemia, para medidas emergenciais como linhas de crédito e compras governamentais, sugerindo um caminho semelhante neste momento.
“Esperamos que [as tarifas] sejam adiadas ou evitadas. Mas, se não forem, precisamos agir juntos, de forma coordenada, para proteger empresas e trabalhadores”, apontou.
Democracia e responsabilidade social
Na sequência, o ministro Fernando Haddad (Finanças) apresentou dados sobre os avanços do governo Lula, a começar pela saída do país do Mapa da Fome da ONU. “Nada é mais importante do que garantir que as pessoas tenham o que comer. E conseguimos isso graças a uma rede de proteção social reativada e fortalecida”, afirmou.
O ministro destacou que a taxa de desemprego atingiu o menor nível da história, com recorde de trabalho formal e três anos consecutivos de crescimento da renda média do trabalhador. A inflação está em trajetória de queda e deve fechar o ano abaixo de 5%. E a desigualdade social foi reduzida ao menor patamar já registrado no país. “Esses dados mostram que é possível fazer política fiscal com responsabilidade sem sacrificar os mais pobres. Não fizemos ajuste no lombo do trabalhador”, afirmou Haddad.
Sobre o tarifaço, o ministro da Fazenda relembrou que, graças à política externa inaugurada por Lula em 2003, a dependência comercial do Brasil em relação aos EUA foi significativamente reduzida: enquanto naquele ano os Estados Unidos representavam 25% das exportações brasileiras, hoje esse número caiu para 12%.
“Desses 12%, apenas 4% são afetados diretamente pelo tarifaço. E desses, mais da metade são commodities que têm mercado internacional garantido e encontrarão destino no curto ou médio prazo”, explicou. Ele destacou que há setores específicos, como a fruticultura, que exigem atenção especial por empregarem milhares de brasileiros e estarem mais expostos a oscilações externas. “Não vamos baixar a guarda. O governo federal dispõe de instrumentos para proteger famílias e cadeias produtivas ameaçadas por essa agressão injusta e indevida”, afirmou.
Haddad também ressaltou as contribuições do Conselhão, sobretudo na área de crédito, como a criação de programas como o Desenrola Brasil, as quatro linhas do programa Acredita e o Crédito do Trabalhador. “Há cinco projetos de lei que já tratam de temas discutidos aqui e que exigem mudança legislativa. Algumas dessas propostas estão em tramitação desde o fim de 2023 com o apoio do Conselhão”.
Em seu discurso, o presidente Lula trouxe uma defesa contundente da soberania brasileira, ao garantir que seu governo “não transigirá e não vacilará em seu dever de preservá-la” e que a independência dos Três Poderes é inegociável.
“Essa interferência contou com o auxílio de verdadeiros traidores da pátria, que aqui tentaram e defendem publicamente ações contra o Brasil”, declarou Lula, ao afirmar que as ações de Trump têm motivações eleitorais e que o país não permitirá que interesses externos interfiram na economia nacional.
A resposta do Brasil, salientou, será firme e diplomática. Ele mencionou que não deixou de negociar com Washington e citou os sistemáticos esforços do Itamaraty e da área econômica de seu governo neste sentido.
Lula também anunciou que o país contará com uma política nacional voltada à exploração de terras raras, um setor estratégico à indústria tecnológica global. “Durante séculos, a exploração de riquezas minerais gerou riquezas para poucos e deixou rastro de miséria para muitos (…)Estamos construindo uma política nacional que vai garantir que a exploração desses recursos traga ganhos ao povo brasileiro”, afirmou.
Aos membros do Conselhão, ele relatou a importância do coletivo e que resolveu recriá-lo, neste 3º. Mandato, “para fazer o que vocês fazem: se reunir, dar palpite, fazer sugestão, elaborar projetos de lei e projetos de decreto. E para que os ministros atentem se é possível chegarem a mim com a proposta de mudança”.
“Isso se chama levar a democracia a um nível pouco conhecido no mundo de hoje”, concluiu.
Foto: Ricardo Stuckert/PR

